AMIZADE


Baby, desculpe a demora.
Em tempos de e-mail, parece ridículo que você precise esperar tanto tempo por uma palavra minha, como se vivêssemos num interior ermo e perdido no tempo.
Não venha me dizer que sim, vivemos nesse interior. O nosso próprio não conta. Do contrário, estaríamos ambos à beira do abismo desde que nos entendemos por gente, não? E nem venha dizer que sim, estamos mesmo. Sem graça! Você me conhece demais, e pouca novidade resiste a esse risco iminente que a gente chama de melhor amigo.
Tudo por aqui tem sido um pequeno estrondo. Vou pular o que é ameno e ir direto ao que você quer saber: eis que já chegamos ao "eu te amo tanto que não tenho medo de te perder", vê se pode. É o tipo de confissão com o qual ninguém está preparado para lidar. Alguém com 80 anos e muitos amores na memória, talvez, não sei. E soou errado a princípio, pouco lisongeiro, quase uma ofensa disfarçada de alguma outra coisa, mas ainda com cara de ofensa. Só que depois eu entendi. É algo bom, e há mais carinho nisso do que se percebe na superfície. No exagero, o amor é tanto que não há condição de pertence.
Bonito, né? Parece aquele tal amor maior, ou ao menos algo próximo do que contam que é o amor maior. Não que eu entenda muito de amor, é claro, quem dirá dos maiores, mas ao  menos parece ser o tal que chegou aqui pertinho. Ou talvez tenha sido eu quem inventou o que quis, não sei. O que não é possível, né? Bem, foi isso o que ousei, destemido eu, ouvir, com olhos nos olhos, cabeça no colo, mãos na pele, coração na boca, todo aquele clichê apavorante.
Mas, veja só, seguimos distantes, um cá, outro lá. Por ter pressa, olha que curioso, ou então por algum ideal romanceado que acaba barrando um desfecho.
Talvez a gente ache o conflito bonito, sei lá.
Sei que é como num filme muito bom, mas triste, daqueles que têm criancinha, daqueles em que a criancinha morre no final.
Não sei dizer muito além disso por enquanto. Mas atualizo você, sim? Torço (torça também!) para que em pouco. Tenho me cansado muito, mas, percebo, mais pelo silêncio do que pela ação, o que é uma vergonha.
Poetizei demais? Dramatizo com ares de piada, você entende, né? E na sua cabeça, o que há de importante ou de disfarçadamente banal? Conte-me.
Não é possível que eu seja a única pessoa à beira do abismo e de alguma forma de loucura por aqui. Rarrá.
Um beijo, F.