OFENSA


Ela foi embora e levou com ela qualquer vestígio de já ter estado aqui um dia.
O livro esquecido entre os meus numa prateleira da sala, a camiseta velha que usava como pijama nos dias mais frios, o guarda-chuva colorido que comprou e largou num canto, nunca se preocupou em carregar por aí.
Finalmente, levou.
Não me atirou em total surpresa, o "não dá mais" de uma noite atrás já havia me alertado de que todas essas coisinhas banais deixariam a minha casa em algum momento.
Deixaram com pressa. Ela foi com pressa. Com a pressa de quem sabe que já jogou tempo demais fora comigo e que a vida nova deveria começar o quanto antes, sem desperdício adicional.
A pressa não me ofende.
Ela ter se cansado de mim também não me ofende, sequer fere qualquer conceito empoeirado que eu tenha em relação ao amor, à vida, a sei lá. Aceito o passado, e entendo que há inércias impossíveis de manter.
Não me ofendo. Choro em silêncio, apenas, sabendo que, mais do que de vez em quando, há pouco que se pode fazer quando o amor decide ir embora.