TRAIÇÃO


Lembro exatamente da primeira vez em que te traí. Foi rápido e mais fácil do que eu achava que seria.
Porque a gente sempre espera a culpa, a crise, o "meu deus, eu não presto". Mas nada disso veio. Foi rápido, relativamente limpo, sem rastros. Foi bem feito. E não me arrependi, porque no outro dia a vida seguia como sempre. Você não mudou, eu não mudei. Aconteceu e tudo continuou como sempre foi.
Considerei, então, fazer de novo.
Não que tivesse sido aquele estouro, passou longe de ser o melhor sexo da minha vida. Mas foi diferente. Um corpo novo, mesmo que cheio de defeitos, um ritmo ainda a descobrir, a chance de testar personas que você já tinha se acostumado a não enxergar em mim.
Fiz coisas que te surpreenderiam.
A segunda não foi tão diferente. Aproveitei aquele tempo, e depois disse que nem tinha saído de casa. Tomei um banho demorado e segui sendo eu.
Foi na terceira, acho, que senti algo pela primeira vez: pena de você, não sei exatamente o porquê, e na quarta deixei a crise chegar. Chorei um pouco, em vão, desapareci e jantei sem companhia enquanto você me esperava em casa, e pensei em contar tudo.
Marquei dia e hora para parar.
Foi aí, e era dezembro, que descobri sem procurar que você me traía também.
Te odiei.
Senti a mentira, chorei a falsa ilusão de que éramos o casal perfeito, ilusão que você tirou de mim. E aí fui para a quinta, com cores de vingança, para fazer você pagar pela dor que eu senti, nos enterrando e te dando a culpa toda de presente.
A sexta e a sétima vieram sem pausa, com uma urgência violenta que, em outros tempos, me assustaria. Fiz por raiva, para você pagar.
A oitava foi mais por costume.
A nona, nem queria, mas a gente já não estava mais se falando, e naquele ponto eu não conseguiria dormir sem um toque. Precisava de um abraço que veio suado, fazendo graça, com pressa, e perdi o olhar nas manchas das paredes enquanto o novo rapaz voltava leve do banheiro e falava qualquer coisa desinteressante sobre a própria vida.
Continuei na cama.
Passei a noite sem ninguém naquele motel vagabundo.
A décima vez, nem sei se foi traição. Não te via há mais de uma semana, e continuei sem te ver, até você aparecer para dizer que não me queria mais.
Era janeiro, e você me deixou no chão do quarto detonado, para a faxineira anônima limpar. E voltou a ser feliz mais rápido do que eu. Voltou a chifrar quem você ama mais rápido do que eu.
E saudade é o que eu mais tenho. Saudade e esse amor enorme, que não morre de jeito nenhum.